Enquanto os arquitetos egípcios exercitavam seu entendimento do modernismo no tecido urbano na década de 1970, uma "rebelião" na forma da Vila Badran desafiava as formas padronizadas e a geometria rígida. Gamal Bakry mergulhou profundamente em sua imaginação para construir esta obra única que ainda faz parte da cidade do Cairo. Com fachadas curvas e fluídas, a Vila Badran se inspirou em formas naturais. Na tentativa de criar um espaço mais natural em sua essência, a intervenção consiste em uma composição monolítica que abriga uma casa de dois pavimentos projetada para uma família.
No primeiro andar, a parte privada da casa possui um escritório, dois quartos e um terraço. Por outro lado, a parte pública da casa compreende a sala de jantar, a sala de estar e o salão, criados por meio de uma forma livre curvilínea natural. Uma lareira circular está instalada no centro da sala de estar, e uma escada elíptica localiza-se no coração da casa, em frente ao hall de entrada. Esta escada leva os visitantes ou proprietários diretamente ao segundo andar. O quarto principal neste andar tem vista para o jardim e todas as áreas comuns são voltadas para a rua. No térreo, um grande pátio central com uma planta irregular é acessível a partir da entrada principal. Além disso, o volume distingue-se pela sua delimitação específica do programa, evidenciada por ligeiras alterações nos níveis de pavimentos. A mesma mudança sutil no piso é replicada em toda a linha do telhado, criando formas marcantes de iluminação que indiretamente entram na casa em diferentes momentos do dia.
A Vila Badran representa um dos momentos mais significativos de experimentação em formas arquitetônicas orgânicas. A residência foi originalmente projetada para uma família de classe média na Rua do Sudão em Mohandiseen, uma região de classe média alta do oeste do Cairo planejada para abrigar edificações de uso misto estendendo-se até o centro da cidade. O terreno era originalmente um vasto campo agrícola e, por esse motivo, o projeto foi inicialmente planejado para ser construído em adobe. No entanto, devido a razões práticas e experimentais, foi construído em concreto armado e deixado aparente, com um tom avermelhado.
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Egito moderno: nova arquitetura em um mundo antigoAlém disso, Bakry pretendia ser pioneiro na arquitetura de concreto na década de 1970, alegando que ela era mais elástica do que as pessoas imaginavam e poderia ser adaptada em muitas formas diferentes. O projeto explora as qualidades da famosa casa de tijolos de barro egípcia, insistindo que uma aparência semelhante pode ser alcançada e admirada através da plasticidade do concreto. Bakry e Hassan Fathy, o pai da arquitetura moderna de tijolos de barro no Egito, costumavam dizer que tinham um relacionamento colaborativo em que Fathy revisava o trabalho de Bakry. Além disso, a forma flexível também é baseada em uma melodia espacial e é fiel ao programa. Isso quer dizer que a fachada externa reflete as qualidades únicas do interior, sem falsas adições ou suportes de parede fabricados.
No guia arquitetônico de Mohamed El Shahed, Cairo desde 1900, o autor explica a profunda tragédia que aconteceu e continua a acontecer com a demolição desses edifícios significativos. O livro destina-se a servir como um registro imaginado do que Cairo poderia ter sido em um clima político diferente. Vila Badran, designada a ser uma rebelião completa contra a forma padronizada do modernismo que tomou a capital, foi abandonada e atualmente está em estado de degradação. A casa foi vendida pela família original e transformada em um restaurante. Ela não está bem conservada e isso levou à demolição dos quartos, que estavam localizados no térreo. Além disso, adições de novos espaços que desfiguraram o acabamento original da fachada foram feitas para abrigar as várias novas funções da casa.
Embora o cliente tenha contatado especificamente o arquiteto por suas capacidades pioneiras com formas curvilíneas, a família decidiu vender a casa cerca de oito anos após a compra. É um equívoco comum acreditar que uma casa com um caráter tão pouco convencional se ajustaria de forma prática aos rituais cotidianos. Em conversa com Dalila ElKerdany, Ph.D., esposa do arquiteto, sua primeira reação foi que a inconveniência de personalizar móveis e não poder usar objetos retangulares foi a principal razão pela qual a casa foi vendida. Além disso, o bairro circundante era principalmente formado por terras agrícolas na época da compra, criando uma sensação arejada e pacífica para complementar sua natureza orgânica. Após muitas fases de desenvolvimento e urbanização, a localidade já não é o santuário que costumava ser.
A Vila Badran foi um dos muitos projetos que Gamal Bakry desenhou em 1970. Em meados dessa década, ele projetou a cabana de verão do ex-presidente Anwar ElSadat em El Montaza, Alexandria. De acordo com os planos do arquiteto, o chalé de verão foi restaurado e reconstruído recentemente. O espaço, que já foi uma residência de verão, agora abrigará uma exibição pessoal do trabalho e da vida de Bakry. Não há lugar mais adequado para o museu, pois este é considerado o trabalho de maior destaque do arquiteto na experimentação curvilínea.
A arquitetura egípcia modernista é frequentemente diluída em narrativas europeias que não lançam luz sobre o quadro completo do modernismo do Cairo. O país experimentou diversos estilos de construção e culturas de projeto, incluindo a Vila Badran. Isso continua até hoje na medida em que a arquitetura egípcia contemporânea é moldada e remodelada. Mais recentemente, uma empresa social, em um dos maiores assentamentos informais do Cairo, foi transformada em um centro comunitário. O centro oferece emprego e treinamento vocacional para mulheres migrantes, refugiadas e egípcias. Outro exemplo de arquitetura contemporânea é a Mesquita Basuna de Dar Arafa Architecture localizada na árida cidade de Sohag, oferecendo paz e tranquilidade aos seus usuários. Por fim, o Centro de Visitantes Wadi El Gemal da Associação Egípcia de Construção em Terra é outro exemplo de uma nova compreensão do vernáculo de Cairo. A edificação está localizada em Marsa Allam e usa materiais de construção locais e a notória árvore Acácia para criar um centro de visitantes.
Esse artigo é parte de uma série do ArchDaily intitulada AD Narratives, onde compartilhamos a história por trás de um projeto selecionado, mergulhando em suas particularidades. A cada mês, exploramos novas construções de todo o mundo, destacando suas histórias e como elas aconteceram. Nós também conversamos com arquitetos, construtores e com a comunidade que busca ressaltar sua experiência pessoal. Como sempre, no ArchDaily, nós apreciamos muito as sugestões de nossos leitores. Se você acha que deveríamos apresentar algum projeto, por favor, mande sua sugestão.